MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Procuradoria da República no Município de Santos
Exmo. Sr. Juiz Federal da 4ª Vara Federal de Santos, SP
Ação Civil Pública
MINISTÉRIO PÚBLICO
FEDERAL, pelo Procurador da República que esta subscreve, vem, respeitosamente, com
fulcro no art. 225 da Carta Magna e amparo nas Leis 7.347/85 e 6.938/81,
perante V. Exª propor a presente ação civil pública contra a
UNIÃO FEDERAL, pessoa jurídica de direito público interna, com representante
na cidade de Santos, SP., junto ao Prédio da Justiça Federal e CARBOCLORO
OXYPAR INDÚSTRIAS QUÍMICAS S/A., CNPJ 31659584/0001-35, estabelecida em Cubatão,
SP., junto ao Km 04 da Estrada de Piaçaguera, para condená-los a reparação
de dano ambiental e a cumprir obrigação de fazer, pelas razões de fato
e de direito que passa a expor:
Em síntese, o que se busca nesta ação é evitar a contaminação por mercúrio ao meio ambiente.
Pois bem, décadas atrás (década de 50) a catástrofe ecológica na Baía de Minamata, no Japão, alertou todo o mundo dos riscos de contaminação com o mercúrio, tendo em vista que o local foi afetado pelo mercúrio orgânico que entrou na cadeia alimentar, contaminando peixes, aves, gatos e milhares de pessoas que apresentaram distúrbios mentais (mais de 1.330 pessoas morreram) e, posteriormente, deformações genéticas transmitidas aos seus descendentes.
A co-ré CARBOCLORO possui, em pleno limiar do século XXI, células de mercúrio funcionando, para fabricar soda e cloro, muito embora a décadas tal tecnologia já esteja superada por agredir violentamente o meio ambiente (atualmente se usa células de membrana), apenas pelo fato de que seria “caro” (“custoso”) trocar as atuais e obsoletas células de mercúrio por células de membrana.
A CARBOCLORO deposita aproximadamente 1.295 quilogramas de mercúrio metálico em cubas (total de 60 cubas), que possuem abastecimento contínuo de salmoura, que após a eletrólise, dão origem a uma produção de aproximadamente 5,6 toneladas de soda/dia e 5,0 toneladas de cloro/dia. E os resíduos do mercúrio vão para onde??
A presente representação, que ensejou a subjacente ação civil pública (protocolo 08123.030.095/98-80), é oriunda do Ministério Público Estadual de Santos (13º Promotor de Justiça), datada de 07.04.98, informando sobre contaminação/poluição do estuário, inclusive por poluentes com carga mutagênica (mercúrio).
As fls. 03/05 consta termo de declarações prestadas por Márcio Pedroso, ex-operador de processo químico da CARBOCLORO OXIPAR INDÚSTRIAS QUÍMICAS S/A., com sede em Cubatão, informando, em síntese, que trabalhou 17 anos na empresa, tendo sido demitido em 1991; que trabalhou por 08 anos em uma unidade que produz soda cáustica, que utiliza o mercúrio em sua produção; que inicialmente a empresa não respeitava o meio-ambiente e despejava resíduos sem tratamento contendo mercúrio três vezes ao dia no Rio Cubatão; que atualmente a bacia que recebia os resíduos não existe mais, sendo que o resíduo de mercúrio é reaproveitado pela empresa; que até princípios da década de 80 os resíduos de mercúrio eram despejados diretamente no rio, período em que passou a usar o tratamento de lama, com reaproveitamento dos resíduos; que o seu trabalho era manipular o mercúrio, inclusive sem proteção; que a CARBOCLORO nunca informou os males do contacto com o mercúrio; que passou a sofrer de epilepsia por conta da contaminação com o mercúrio; que o mercúrio acabou contaminando toda a região, conforme declaração do biólogo Robson Silva e Silva (Revista Veja de 05.06.96; fls. 10 e 11); que o supervisor da CARBOCLORO Floriano Peixoto ordenou em 80 ou 82 a retirada da lama contendo mercúrio, mediante um caminhão limpa fossa, não sabendo onde foi jogado o produto; que soube pelo noticiário que o mercúrio contaminou os frutos do mar da região e ainda o lixão químico de Pilões, fl. 12 (conforme o biólogo Fábio Giordano da Universidade Santa Cecília; fls. 08 e 09); que a CETESB emitiu vários autos de infração e imposição de penalidades à CARBOCLORO (059612 em 28.04.89; 102756 em 10.09.92; 102767 em 11.11.93 e 036587 em 05.07.94; fl. 22); esclareceu que a legislação admite 0,010 mg/l como o limite máximo de concentração de mercúrio em efluentes; que existem locais em que há mercúrio enterrado a 30 cm do solo; que na Revista Saúde Pública, nº 27, de 1993, fls. 12/21, o Dr. Eládio Santos Filho, afirmou que a região da bacia do Rio Cubatão está contaminada pelo metal pesado mercúrio, envolvendo riscos à saúde, não somente pelo contato direto, mas também através do pescado (fotos de fls. 23/30 da precariedade das instalações da CARBOCLORO em 91/92).
As fls. 34/46 consta levantamento preliminar do grau de contaminação de amostras de sedimento do canal de Santos realizado pela CETESB entre 06 a 14 de outubro de 1997, onde vem informado que: “Os níveis de contaminação química, toxicidade e atividade mutagênica ...evidenciam que as proximidades da COSIPA e do Porto de Santos, tanto no canal de dragagem como nas margens, está impactado por poluentes antropogênicos...As concentrações de metais pesados evidenciam a contaminação do sedimento por fontes industriais...a amostra de sedimento do terminal portuário da COSIPA apresentou toxicidade aguda... todas as amostras apresentaram toxicidade crônica (exceto Ilha do Barnabé) e atividade mutagência (exceto margem da Alemoa)...”
A fl. 52 compareceu na PRM/Santos, o Sr. Márcio Pedroso, reiterando o que já havia dito as fls. 03/05, perante o Ministério Público do Estado, juntando cópias de documentos. Afirmou ainda que o mercúrio enterrado pela CARBOCLORO foi asfaltado ou concretado, sendo que as aguais pluviais que levavam o mercúrio para o Rio Cubatão não mais fazem isso, mas a contaminação dos frutos do mar continua, pois o produto serve de alimento para peixes e raias, que se alimentam de sedimentos do fundo. Afirmou também que a emissão de vapor de mercúrio é mínima e que no verão pode ser observada, e que o aparelho ORSAT não é adequado para detectar a presença do vapor de mercúrio. A fl. 55 o autor da representação juntou artigo sobre a estrutura socioeconômica do Município de Cubatão, informando que em 1983, 215 moradores, entre 20 e 29 anos, apresentaram concentrações acima do limite máximo de 0,3 mg/100 g estabelecido no Brasil. A fl. 56 a carta do autor da representação ao jornal A Tribuna, informando que o mercúrio é um metal pesado, que não se degrada na água, e causa desde uma simples intoxicação, até distúrbios neurológicos graves. Desde os anos 60 já existe comprovação desta relação. De fls. 58/60 reportagens de jornais sobre a questão.
A fl. 70 consta rol de doenças causadas pela contaminação crônica do mercúrio: Fraqueza, paralisia, atrofia muscular, tremores, cegueira, insônia, dor de cabeça, fadiga, alucinações, demência, faringites, malformação do feto, dentre outras.
De fls. 72/83 há um laudo feito por Engenheiro da Fundocentro sobre a contaminação por mercúrio em Márcio Pedroso, onde consta que tinha contacto com mercúrio, através da remoção de resíduos, reposição do mercúrio metálico, embalar o mercúrio em garrafas plásticas, onde vem afirmado que nos 15 anos o autor da representação sempre trabalhou na CARBOCLORO na produção de soda e cloro através de cubas a mercúrio ou células DeNora (fls. 69 e 76 há croquis da célula DeNora). De fls. 73/75 há fotos de vazamento de mercúrio. A fl. 77 consta que no Japão foi proibido o uso (ficou conhecido como a doença de MINIMATA, em que em 1953 e 1964 morreram dezenas de pessoas por terem consumido peixes contaminados por mercúrio) do processo com cubas de mercúrio, o qual é mais barato, mas causa prejuízos graves ao meio ambiente e a saúde. O laudo afirmou a fl. 82 que Márcio Pedroso apresentou a partir de 1986 alterações psíquicas, como depressão e dificuldade de concentração, em decorrência da intoxicação mercurial, sendo portador de hidrargerismo (contaminação por mercúrio metálico; doença profissional com nexo causal constatado).
A fl. 87 consta resposta do Instituto de Pesca de que já publicou o trabalho sobre a ocorrência de mercúrio, chumbo e cádmio no litoral da Baixada Santista (cópia as fls. 103/108), onde consta que no período de setembro de 96 a fevereiro de 97 foram analisados 68 amostras de moluscos bivalves, que apresentaram níveis de concentração de metais pesados inferiores aos estabelecidos pela lei brasileira e do Mercosul. Entretanto o estudo afirmou que foi constatado que de todos os metais pesados analisados, o mercúrio foi o único que apresentou concentrações comprometedoras na musculatura dos peixes estudados, evidenciando-se uma contaminação da região por esse metal... o estuário retém maiores quantidades de metais pesados... evidencia-se quanto mais próximo do pólo industrial, maior o nível de contaminação.
A CETESB respondeu as fl. 116/134, dizendo que concluiu que a CARBOCLORO vem contaminando o Rio Cubatão com dejetos de mercúrio. O estudo apontou a existência de contaminação, a qual de maneira geral, está dentro de padrões aceitáveis a nível internacional. Assim, estabeleceu duas exigências para a empresa CARBOCLORO: 1) Monitoramento contínuo do teor de mercúrio nos efluentes líquidos, de forma a prevenir eventuais lançamentos fora dos padrões estabelecidos em lei, com transmissão dos dados on-line para a agência ambiental de Cubatão; 2) Fazer levantamento hidrogeológico da indústria e arredores, para verificar fontes de contaminação das águas subterrâneas e definir procedimentos para recuperação ambiental.
A CETESB informou ainda que a CARBOCLORO fica na Estrada de Piaçaguera, Km 04, em Cubatão, sendo que começou a operar em abril de 1964, quando foram instaladas células de mercúrio, com capacidade para produzir 17.500 toneladas ano. Em 1971 ampliou a produção para 96.000 ton/ano. Em 1981 passou para 206.000 ton/ano, com o início da operação células de diafragma. Em 1989 passou para 235.00 ton/ano. Os efluentes contaminados com mercúrio da indústria são provenientes das células que utilizam o metal na produção de cloro, que são tratados em estação a partir de 1977 (antes disso eram despejados diretamente no Rio Cubatão após serem tratados em caixa de sedimentação).
A fl. 123 no relatório da CETESB vem asseverado que das 19 penalidades aplicadas na CARBOCLORO a partir de 1983, cerca de 20% (05 penalidades), decorreram de níveis de mercúrio acima do limite estabelecido pela legislação, colocando em risco o ambiente e a biota aquática, tendo sido a última aplicada em 1994. Ficou registrado ainda, fl. 125, que o lançamento de efluentes contendo mercúrio nas águas do Rio Cubatão provoca a contaminação do ambiente aquático e atinge o estuário onde se procriam diversos organismos aquáticos. A fl. 129 ficou registrado que em estudo realizado em 1989 foi constatado que em 21,2% das amostras retiradas do Rio Cubatão, o índice de mercúrio estava acima do limite legal. A fl. 130, ficou registrado que em 1997 o Rio Cubatão sofreu o impacto decorrente do lançamento de mercúrio proveniente de diversas fontes, entre elas a CARBOCLORO, e que embora não se evidencie maiores riscos em termos de mercúrio, os dados relativos ao lançamento de efluentes da CARBOCLORO contendo o metal, indicam situações em que há ultrapassagem do padrão estabelecido em lei.
Em estudo realizado em 1990, fl. 130, restou constatado que alguns peixes da Bacia do Rio Cubatão, ultrapassaram os limites máximos admissíveis de contaminação com mercúrio (como “e.g.” o robalo, a tabarana, a caratinga). E ainda que os dados indicam que o processo natural de acumulação biológica de mercúrio, pode levar à concentração danosa na musculatura de peixes oriundos do Rio Cubatão, expondo à comunidade que consome este alimento a um risco de contaminação. Em estudo realizado em 1993 por Santos-Filho, fl. 135/143, restou constatado que as crianças que consomem peixes oriundos do Rio Cubatão, apresentam teores de mercúrio no sangue significativamente maiores do que as que não consomem.
As fls. 163/164 foi tomado novamente o termo de declarações do autor da representação, que juntou ofício do IBAMA a fl. 165, informando que a CARBOCLORO somente se registrou no IBAMA a partir de 14.08.98, declarando movimentar 10.800 Kgs. de mercúrio metálico para o ano de 1998, sendo que portanto, no período entre 1964 a 08.98, o IBAMA não possui dados sobre movimentação de mercúrio pela empresa CARBOCLORO; que soube através da CETESB que houve a ampliação das salas de células de mercúrio, fls. 167/173, em 08 células de diafragma e 04 células de mercúrio, a partir de 06.97; e ainda que protocolou denúncias junto a CETESB de Santos, Cubatão e Promotoria Ambiental de Cubatão, sobre o remanejamento de lama contaminada com mercúrio, dentro da área da CARBOCLORO, pela limpadora Orquidário, sem o devido cuidado na descontaminação do veículo utilizado para tal fim. Em relatório da CETESB juntado nesta oportunidade, fls. 177/178, restou constatado em estudo de BOWDEN, VUDÉTIC, WENBERT & ANDERSON, “...como altamente poluído por mercúrio nos pontos 6 e 9, e como poluído no ponto 10. De acordo com o inventário sobre a poluição das águas do Rio Cubatão, realizado pela Regional da CETESB no ano de 1989, verifica-se que a CARBOCLORO continua sendo uma das fontes desse metal para o ecossistema aquático, com os maiores valores de mercúrio verificados no sedimento o ponto localizado a jusante da referida Indústria. Comparando-se os teores observados em 1988, com os de 1989 no sedimento, verifica-se que houve um incremento dos mesmos, principalmente nos pontos 6, 9 e 10... os sedimentos também foram considerados poluídos para arsênio, mercúrio (20 vezes acima do limite) e zinco."
As fls. 181 a 184 a CETESB apresentou novo relatório, sobre o cumprimento por parte da CARBOCLORO das determinações existentes na recomendação de fl. 117, sendo que em relação a obrigação de fazer levantamento hidroeológico da indústria e arredores, para verificar fontes de contaminação das águas subterrâneas e definir procedimentos para recuperação ambiental, a CARBOCLORO solicitou através de correspondência a prorrogação do prazo por mais trinta dias, em duas vezes seguidas, fls. 186/187. Por seu turno a CETESB em 14.01.99 incluiu no levantamento a área entre Unidade Química de Cubatão da Rhodia e o Rio Perequê, também pertencente a CARBOCLORO, em virtude da presença de mercúrio na área.
Em 15.03.99 a CARBOCLORO entregou a CETESB o plano de trabalho do estudo hidrogeológico e o respectivo programa, o qual foi enviado em 30.04.99 para as áreas específicas (Setor de Resíduo Sólido e Equipe Implantação e Avaliação Tecnológico).
De fls. 188/203 está anexo a solicitação da CETESB a CARBOCLORO, para incluir na área de estudo a área entre Unidade Química de Cubatão da Rhodia e o Rio Perequê, também pertencente a CARBOCLORO (fl. 188), e o estudo do GREENPEACE, constatando a presença de mercúrio no solo.
O estudo do GREENPEACE, fls. 189 e 194, de janeiro de 1999 afirmou que: “Níveis elevados de mercúrio foram também determinados na maioria de amostras deste local...uma amostra a montante da CARBOCLORO continha alto nível de mercúrio que poderia estar associado com a manufatura de cloro...No caso do sedimento da lagoa, o mercúrio foi encontrado numa concentração de 21,4 ppm, mais de 40 vezes o máximo que pode ser esperado em solos e sedimentos típicos não contaminados....os níveis de mercúrio nestas amostras foram mais uma vez maiores do que o esperado, coletadas na margem do Rio Cubatão a jusante da planta da Rhodia e em frente à CARBOCLORO, mostrou uma elevação substancial dos níveis de mercúrio (15,6 ppm), acima do nível normal...”.
De fls. 204/210 está juntado o estudo hidrogeológico apresentado à CETESB pela CARBOCLORO.
A fl. 212 o ilustre colega Dr. Antonio José Donizetti Molina Daloia oficiou ao IBAMA, em 12.11.99, indagando se e desde quando a CARBOCLORO possui registro para importação ou manuseio de mercúrio. A fl. 213 foi oficiado à alfândega sobre a quantidade de importação de mercúrio pela CARBOCLORO desde 1964. A fl. 214 foi oficiado a CETESB se a mesma possuía condições de efetuar o monitoramento ambiental da CARBOCLORO e se o despejo contínuo de mercúrio nas águas, mesmo dentro dos limites permitidos pela legislação, com o tempo não fará com que os peixes e outros organismos superem os valores máximos tolerados, causando problemas aos seres humanos.
O IBAMA respondeu a fl. 216 dizendo que não há registro da firma CARBOCLORO nos arquivos.
A alfândega asseverou a fl. 217 que somente pode informar as importações promovidas a partir de 1992, e que consta uma importação de mercúrio de 10.800 Kg, em 31.07.98, não havendo registro de importação desse produto pela empresa matriz (fls. 218/235).
A CETESB as fls. 236/237 aduziu que não dispõe de recursos humanos e materiais para a realização completa do monitoramento, sendo que entretanto poderia fazer uma análise de águas subterrâneas e solo, para fins de comparação. Sobre a questão da contaminação paulatina por índices de mercúrio dentro dos “limites legais”, a CETESB pediu prorrogação de prazo. E, por fim, juntou os pareceres dos setores de resíduos sólidos e implantação de tecnologias acerca do Plano de Trabalho apresentado pela CARBOCLORO.
De fls. 238/240 consta a informação técnica da CETESB afirmando que a proposta de Estudo Hidrogeológico apresentado pela CARBOCLORO de fls. 204/210 cumpre com os objetivos da Agência Ambiental, mas que todavia apresentou dez aprimoramentos a serem feitos, como “e.g.” o detalhamento do plano indicando a malha de locação das sondagens; o revestimento dos poços de monitoramento com PVC rígido ou CPVC (não se admitindo o UPVC); o envoltório granular anular pré-filtrante deverá ser obrigatoriamente com areia grossa, não se aceitando areias provenientes de britagem de rochas, pedriscos ou pedra britada, entre outros.
As fls. 241/242, em 20.09.99, a CETESB afirmou que as conclusões indicam uma insuspeita contaminação dos ambientes aquáticos envolvendo tantos os sedimentos, as águas, como também os organismos vivos, devido ao mercúrio (Hg).
De fls. 245/276, há documentos apresentados pela Drª Karen Guassuna do GREENPEACE, sendo que o de fls. 245/259 já consta do procedimento as fls. 189 e ss. O de fls. 260/265 diz respeito a estudo realizado em dezembro de 1998 na empresa RHODIA S.A. instalada em Cubatão, aduzindo que foram encontradas grandes quantidades do metal pesado mercúrio entre as áreas da CARBOCLORO e da ELETROPAULO.
De fls. 267/270 constam informações compiladas pelo GREENPEACE em dezembro de 1998 sobre a empresa privada CARBOCLORO, que é composta de 50% de capital nacional, com ações pertencentes à UNIPAR e outros 50% pertencentes à estrangeira OXYCHEM (segunda maior produtora de cloro do mundo). Que a empresa é responsável por 49% da produção nacional de cloro e 17% da soda cáustica (Guia da Indústria Química Brasileira; fls. 271/273) e para a produção de cloro-soda, a CARBOCLORO utiliza duas tecnologias: células de mercúrio (42% da produção) e diafragma (52% da produção). Está instalada em Cubatão, SP., desde 1964, tendo faturado em 1998 144.267 milhões de dólares. Em 1993 possuía 829 empregados. Em 1998 reduziu o número para 454 empregados. Aduziu o GREENPEACE que em 03 áreas pesquisadas próximas a CARBOCLORO, fl. 266, foram constatadas altas e venenosas presenças de mercúrio, mormente defronte a CARBOCLORO (área LA 8005; fl. 267 – fotos as fls. 274/276).
A fl. 286 consta nova denúncia do autor da representação de que a CARBOCLORO está removendo terra contaminada com mercúrio, o que pode comprometer ainda mais o solo e o lençol freático, alegando que a CETESB autorizou de forma leviana o CADRI (certificado de aprovação de destinação de resíduos industriais).
A fl. 287 o autor da representação lembrou que as amostras coletadas a montante da CARBOCLORO continham alto nível de mercúrio, e no Rio Branco, Bairro do Quantenário, em São Vicente, as amostras de água subterrânea, continham níveis elevados de metais pesados, inclusive de mercúrio, o que poderia ser resultado de lixiviação dos aterros vizinhos, de propriedade da Rhodia; e assim pediu que o estudo hidrogeológico que está sendo feito dentro da área da CARBOCLORO, seja estendida para fora da área; afirmou ainda que as amostras analisadas pela CETESB podem ser passíveis de fraude por funcionário da mesma empresa; e ainda pediu o estudo sobre a área do pó da china, que fica na área da oficina mecânica dentro da CARBOCLORO.
As fls. 288/289, em 12.07.00, consta resposta da CETESB ao ofício da PRM/Santos de fl. 244, de que a agência em Cubatão, já providenciou a análise das águas subterrâneas e de solo no “site” da CARBOCLORO, a serem realizadas proximamente; e frente as complementações solicitadas pela CETESB em 02.12.99, as fls. 238 e 241, a empresa apresentou novo Plano de Trabalho, com o cronograma de ações (anexo I; fls. 291/297). Porém, como o apresentado não atendeu integralmente às solicitações, a CARBOCLORO foi advertida com Auto de Infração, para a apresentação do relatório da Fase 1 (anexo II; fl. 299). Diante disso a CARBOCLORO recorreu de penalidade imposta, através de correspondência, vindo o recurso a ser indeferido. Assim, a empresa apresentou as complementações pedidas pela CETESB (anexo III; fls. 301/310).
Em 27.06.00 em reunião realizada entre a CETESB, CARBOCLORO e Hidro Ambiente, foi apresentada e discutida a Fase I do Estudo Hidrogeológido (anexo IV de lavra da Hidro Ambiente; fls. 337/467).
Ainda a fl. 289 a CETESB em resposta ao ofício de fl. 244 da PRM/Santos, sobre se existe norma técnica que discipline a indicação do número de pontos mínimos de amostragem permitidos por área, aduziu que a norma que disciplina a matéria é a NBR 13895 (Construção de Poços de Monitoramento e Amostragem; anexo V – fls. 468/490). Na seqüência a CETESB apresentou o inventário da contaminação do ar e de resíduos sólidos da empresa CARBOCLORO, afirmando não possuir ainda o inventário dos efluentes líquidos (anexo VI; fls. 491/534). Após a CETESB encaminhou as cópias solicitadas de inteiro teor dos processos corretivos que deram origem a multas e advertências contra a CARBOCLORO (anexo VII; fls. 535/669).
E por fim, a fl. 289, a CETESB respondeu ao item b do ofício da PRM/Santos de fl. 214, de que se o despejo contínuo de mercúrio nas águas, mesmo dentro dos limites permitidos pela legislação, com o tempo não fará com que os peixes e outros organismos superem os valores máximos tolerados, causando problemas aos seres humanos, dizendo no anexo VIII, que "... dependendo da concentração, os efeitos podem ser fatais, principalmente quando atinge o sistema nervoso, podendo causar uma série de dependências irreversíveis, e até a morte.Se os despejos deste metal forem contínuos, isto pode favorecer os processos de metilação..."
A fl. 311 a CETESB entregou em anexo o Plano de Trabalho da 2ª Fase do Estudo Hidrogeológico apresentado pela CARBOCLORO (anexo IX – fls. 671 a 680).
De fls. 684/685, o autor da representação, voltou a apresentar denúncias contra a CARBOCLORO, dizendo que na referida empresa, sita na Estrada Piaçaquera, Km 04, existe uma linha de transferência que era utilizada para bombeamento de hidrogênio gás da CARBOCLORO até a indústria ALBA. E, nesta linha havia um ponto a descoberto, em baixo do viaduto no rio, o qual foi aberto por mecânicos da CARBOCLORO, onde foi constatado grande quantidade de mercúrio metálico. Pela informação, este mercúrio metálico saía das células a mercúrio e somente recebia um resfriamento, para ser transferido para outra unidade, para ser comprimido e enviado para a ALBA. Afirmou ainda que “não existia nenhum sistema de filtragem desse gás com o mercúrio... e pela linha passar por área que não pertence a CARBOCLORO esta empresa não tomou as medidas cabíveis de cautela... a corrosão vai tomando conta dessa tubulação..."
De fls. 689/693 a CETESB respondeu ao ofício de fl. 282 da PRM/Santos, dizendo que entre setembro a dezembro de 1983 a CETESB iniciou a fiscalização na CARBOCLORO, vindo a aplicar penalidade de advertência (infração 040193), com exigência técnica para apresentação em 90 dias de projeto de colocação final de resíduos industriais e domésticos. Como solução a CARBOCLORO optou pela construção de silos de superfície e silos subterrâneos, para estocagem temporária e definitiva, respectivamente, dos seus resíduos sólidos contendo mercúrio. Foram 08 silos subterrâneos na área B, revestidos com manta de poliéster de 0,45m. Com isso foi solicitado o monitoramento, com 14 poços, para avaliação de contaminação do lençol freático, sendo que se fosse constatada a contaminação por mercúrio, a CARBOCLORO deveria proceder a retirada do material ali depositado (anexo I; fls. 694/698). Paralelo a isso a CARBOCLORO apresentou cronograma para encapsulamento dos resíduos contendo mercúrio. Durante anos foi monitorado o lençol freático da área B, junto aos silos subterrâneos, sem a constatação de contaminação (anexo II; fls. 699/707). Após a CARBOCLORO contratou a empresa HIDRO AMBIENTE para a execução dos trabalhos. Segundo a CETESB este armazenamento dos resíduos contendo mercúrio em silos subterrâneos era provisório (até o surgimento de nova tecnologia). Assim, foi contratada a empresa ECOSSISTEMA GERENCIAMENTE DE RESÍDUO, regularizada perante a CETESB, pela CARBOCLORO para tal fim (remover o resíduo mercurial da área). Em 18.11.99 a empresa recebeu através da CADRI, aprovação para o envio de 2.000 t de resíduo com mercúrio, armazenados nos silos subterrâneos da área B, para São José dos Campos, SP., para outra empresa que iria receber os resíduos. Com isso a empresa ECOSSISTEMA passou a remover os resíduos com retroescavadeira para duas caçambas, e após para tambores revestidos de plástico de 200 litros. Durante a operação foram realizadas várias inspeções pela CETESB. Como foi ultrapassado o volume de 2.000 t de resíduo mercurial, a CARBOCLORO solicitou nova CADRI. Em 15.09.00 foi expedida nova CADRI. Em 06 e 07.07.00 a CETESB fiscalizou a abertura do silo 8. Em 28.07 foi realizada inspeção no buraco do silo 8, para verificar os resíduos de mercúrio (anexo III; fls. 708/710). Em 03.08.00 foi realizada nova inspeção no silo 8 (anexo IV; fls. 710/714), tendo sido enviado para laboratório as análises – e até então não havia resposta. Informou ainda a CETESB, fl. 699, que o Estudo Hidrogeológico iniciado em novembro de 1999 estaria no limiar da 2ª fase.
As fls. 731/734 a ONG ACPO (Associação de Consciência à Prevenção Ocupacional), teceu várias argumentações, contrapondo as informações prestadas pela CETESB de fls. 689/693, dentre elas: “...espera-se contaminar o lençol freático para depois se fazer algo, isso em termos ambientais é absurdo..em São José dos Campos desde 1993 é proibido receber lixo tóxico proveniente de outras cidades... (recorte de jornal a fl. 740) o entamboramento dos resíduos nos animava para que estes tivessem sido em tambores de polietileno resistente, paletizados e estocados em galpões com piso concretado de larga espessura, cercados com diques e cobertos com telhas fixas, onde qualquer escape poderia ser imediatamente identificado antes de sequer atingir o solo e sem colocar em risco o meio ambiente e a população próxima ao aterro. Mas infelizmente não foi o que encontramos no lugar. Os tambores foram esvaziados para dentro da cava com trabalhadores usando EPIs inadequados (foto a fl. 741)... Outra consideração importante é citar que a sondagem hidrogeológica que se faz na área da CARBOCLORO não está levando em conta a área próxima a sala das células de mercúrio e a área onde está montada a oficina de manutenção, onde operou uma fábrica de "pó da china".
Diante disso formulamos a CETESB cinco questionamentos (oficiados a fl. 730; e reiterados a fl. 743), quais sejam a) por que liberou o transporte de resíduos tóxicos para um aterro classe I, com tecnologia ultrapassada, em São José dos Campos, onde inclusive é proibido receber lixo tóxico; b) por que não optou pela armazenamento dos tambores paletizados e em armazéns cobertos; c) que as sondagens sejam estendidas para a região da sala de células de mercúrio; d) que as sondagens hidrogeológicas sejam ampliadas para organoclorados, na região da oficina e pátio de manutenção mecânica, onde operou por anos uma fábrica de “pó da china”; e) que a CARBOCLORO seja intimada a notificar com bastante antecedência a intenção de movimentar resíduos mercuriais a Promotoria Federal e Estadual,dentro de sua unidade ou fora dela.
A fl. 746 a CETESB respondeu ao ofício de fl. 715, juntando o Anexo X (com 143 folhas), que se refere a Fase 2 do Estudo Hidrogeológico.
A fl. 749/751 a CETESB respondeu ao ofício de fl. 743, aduzindo que: questionamento a) Resposta: a empresa ECOSSISTEMA estaria instalada em local sob gerenciamento da empresa ambiental de Taubaté, ao qual teria sido pedido informações sobre a colocação da carga; b) a colocação dos resíduos com mercúrio em tambores paletizados e armazéns cobertos seria provisória, sujeita a propiciar contaminação ambiental; c e d) a extensão da sondagem hidrogeológica da Fase 2 estaria em estudo na CETESB.
Finalmente, as fls. 761/768, consta o resultado do estudo realizado pela CETESB em 03.08.00, que foi a análise do subsolo dos 08 silos, onde estavam depositados os resíduos do mercúrio, que afirma que ao menos em dois pontos (fls. 766 a 768), a concentração de mercúrio localizado foi de 40 vezes acima do maxímo admitido em lei.
Nos poços 2, 5 e 7, os resultados apresentados demonstram níveis de mercúrio no aqüífero subterrâneo, bem acima do admitido na Resolução do CONAMA nº 20, de junho de 1986.
De 769/772 constam fotos das instalações e arredores da CARBOCLORO.
A fl. 784 consta o volume de sal importado pela empresa CARBOCLORO, nos últimos cinco anos, conforme informação da alfândega de Santos.
As fls. 803/804 consta a resposta da SABESP sobre o montante de cloro comprado da CARBOCLORO.
As fls. 785 e ss. consta um laudo pericial realizado em ação civil pública junto a 4ª Vara Federal de Santos (processo 91.0200918-8), pelo Eng. Civil José Gemal, onde consta que a poluição do estuário e baía de Santos, em 1978, já apresentava séria contaminação do ambiente aquático por mercúrio. E que em 1990 a região do Rio Cubatão apresentava metais como o mercúrio em alguns pontos acima dos limites recomendados para a preservação da vida aquática, e que os sedimentos foram enquadrados como altamente poluídos em alguns pontos no concernente ao mercúrio.
O referido estudo ainda apontou no mapa juntado a fl. 802 que a empresa CARBOCLORO despejava no Rio Cubatão em 1990 4,8 quilogramas de mercúrio diariamente.
De fls. 814 e ss. consta relatório sobre a qualidade dos bivalves marinhos na Baixada Santista, sendo que em face de amostragens coletadas entre setembro de 1996 e fevereiro de 1997, ficou constatado a contaminação por MERCÚRIO, sendo que este metal foi o único encontrado em concentração comprometedora na musculatura dos peixes estudados.
De fls. 820/832 está anexado o já referido trabalho do médico Eládio Santos Filho, realizado em mais de 200 crianças que viviam na margem do Rio Cubatão, que constatou que o teor de mercúrio é o dobro nas pessoas que consumiam peixe do rio, das que não consumiam pescados.
As fls. 834/835 consta relatório de visita que o IBAMA fez na CARBOCLORO, onde constatou a existência de depósitos de sal (em duas áreas: uma com 4.800 m2 e outra com 5.750 m2), a menos de 30 metros da margem do Rio Cubatão, destarte, em absoluto desrespeito a Lei 4.771/65, art. 2º, sendo que o órgão ambientalista opinou para que a empresa recupere a floresta no local, com o plantio de espécies oriundas da Mata Atlântica (ou matas ciliares), através de projeto por técnico habilitado, bem como coloque o depósito de sal no mínimo a 100 metros da margem do rio.
Em anexo, fls. 837/844, consta relatório da Eng. Cecília K. Ramos do DPRN, que constatou que parte do pátio para estocagem de sal (cloreto de sódio), localiza-se dentro da área de preservação permanente do Rio Cubatão, com o que, inclusive, negou autorização para expansão da área, que viria atingir inclusive vegetação em regeneração (fotos em anexo).
De fls. 845 e ss. consta informe da CETESB, de que está realizando sindicância interna, face a sérias denúncias contra a CETESB, de que durante a gestão de Nelson Nefussi (95/99), várias empresas, e dentre elas a CARBOCLORO, executavam suas atividades, à míngua das devidas licenças ambientais, sem que houvesse efetiva fiscalização.
E nesta sindicância interna consta que em relação a CARBOCLORO, ocorreu a operação da unidade de dicloroetano, sem a necessária licença de funcionamento, o que foi constatado em vistoria realizada em 27.06.98; em 24.09.97 foi autuada com multa no valor de dez mil UFESP’s, por vazamento de óleo no Rio Cubatão; no período de 16.07.95 a 19.06.96, operou a unidade de produção de ácido clorídrico, sem a licença de funcionamento (não tendo sido autuada neste período).
Por fim, o recente relatório ambiental da CETESB datado de agosto de 2001, sobre o Sistema Estuarino de Santos e São Vicente, afirma em sua Introdução que segundo GUTBERLET (1996), a pescaria no rio Cubatão e nos manguezais era evitada pela população local pois a maioria dos peixes apresentavam a pele manchada, seriam cegos e teriam gosto intragável... Com o prosseguimento das ações de controle da poluição na década de 90 era de se esperar uma redução na exposição da fauna local e conseqüente de seus consumidores aos contaminantes. Levantamentos mais recentes (97 e 98), no entanto, apontam a persistência de problemas de poluição. Em sua página 65 (em anexo; fl.), a respeito do mercúrio, aduziu que em Cubatão, a principal fonte de mercúrio são as unidades eletrolíticas de fabricação de cloro-soda da indústria Carbocloro, que utilizam eletrodos a base de mercúrio.
Há um fato essencial a se colocar, que denota ser absolutamente inadmissível o uso do mercúrio para a produção de soda caústica. Referido sistema, sempre gera resíduo, que se esvai (após um “tratamento”) para o Rio Cubatão – portanto a contaminação é perene.
Ademais, chegamos ao cúmulo de verificarmos a retirada de 4.000 toneladas de resíduos de mercúrio metálicos, que estavam enterradas em silos no pátio da Carbocloro, e que teriam sido levadas para São José dos Campos, que é local que não admite mais receber lixo tóxico.
Afinal, onde estará depositado este mercúrio? Estará ainda dentro dos caminhões? Foi depositado contra a lei na cidade de São José dos Campos? Voltou ao pátio da Carbocloro? Onde estará?
De todos os metais prejudiciais à saúde, o mercúrio é o que apresenta corolários mais nefastos (nesta senda há vários estudos científicos).
Como já alocado no tópico anterior, as conseqüências da ingestão do mercúrio, mesmo que em níveis ínfimos (note-se que o metal acumula-se no organismo), é altamente nefasta. Assim, pedimos vênia para transcrevermos algumas matérias acerca do tema, que serão mais elucidativas que nossas palavras:
Antidepressivo de Lincoln deixou-o
desequilibrado, diz estudo
CHICAGO, EUA (Reuters) - Poucos meses depois de assumir a Presidência dos EUA, Abraham Lincoln deixou de tomar as pequenas pílulas azuis que deveriam curá-lo de sua melancolia. Isso porque o medicamento embaralhava-lhe o juízo. E, segundo declarações feitas por especialistas na terça-feira, Lincoln fez bem. A quantidade de mercúrio contida nessas pílulas poderia tê-lo matado, afirmou o historiador da medicina Norbert Hirschhorn, que realizou um estudo sobre o assunto. "Se Lincoln não tivesse percebido que as pequenas pílulas azuis embaralhavam o seu juízo e não tivesse parado de tomá-las, sua postura verificada durante a Guerra Civil teria sido muito menos firme", escreveu Hirschhorn no último número da revista Perspectives in Biology and Medicine. Os cientistas refizeram a fórmula do século 19 do medicamento azul que era receitado frequentemente em casos de depressão, então conhecida por melancolia ou hipocondria. Entre os ingredientes havia 750 microgramas de mercúrio, uma quantidade prejudicial. Segundo o artigo, quem ingerisse a dosagem usual de duas ou três pílulas do medicamento por dia corria sérios riscos. Antes de assumir a Presidência dos EUA, Lincoln era tomado por explosões temperamentais, um sintoma da contaminação por mercúrio.Entre os problemas neurológicos apresentados pelo líder norte-americano estavam insônia, tremores e ataques violentos, todos considerados efeitos da ingestão do mercúrio. Depois que parou de ingerir as pílulas, os problemas de comportamento aparentemente desapareceram. Lincoln foi o 16o presidente dos EUA e morreu assassinado em 1865.
Curiosidades dos minerais
Mercúrio
O mercúrio é um elemento tóxico não só para o organismo dos seres humanos,
como também para os animais. A sobrecarga deste elemento no corpo vai
eliminar das células o mineral selênio. Mas é um poderoso antioxidante,
utilizado na neutralização dos radicais livres, especialmente na área
cardíaca. É importante
também evitar o aparecimento de células com tumores. Quando o nível
de mercúrio
no organismo está elevado ou acima dos limites de tolerabilidade orgânica,
pode causar uma hiperatividade física e emocional com alterações mentais
e desordem neuromuscular, e também uma perda de apetite patológico.
Observa-se uma variação muito grande quanto à sensibilidade aos níveis de mercúrio
orgânico, quando chega a atingir entre 3 ppm e 5 ppm (partes por milhão). Algumas
vezes, mesmo com níveis menores, a taxa de mercúrio já suprime a atividade
biológica do selênio.
Problemas passageiros, como dores de cabeça e irritabilidade, são
o que mais comumente podem-se observar.
Mercúrio
Dos três metais mencionados (cádmio, chumbo, mercúrio), este é talvez o mais problemático na poluição da cadeia trófica.
Como contamina os alimentos?
Para além das emissões naturais nos locais onde se encontra armazenado (depósitos naturais, vulcões, fogos florestais), existem também as emissões antropogénicas, motivadas pelas indústrias farmacêuticas, de esmaltagem de espelhos, do fabrico têxtil, (como antifungico para proteger de bolores os tecidos), papel e cortiça. Utiliza-se ainda o mercúrio na agricultura como insecticida e fungicida, para proteger sementes. Entre as fontes poluidoras destaca-se o uso do mercúrio como agente catalisador, nas fábricas de cloroalcalis produtoras de cloreto de vinil, acetaldeido e soda cáustica. A presença deste tipo de fabrico é responsável pela poluição da ria de Aveiro. Esta forma de utilização do mercúrio representa 50 a 75% do total das emissões na natureza. O mercúrio é depois arrastado pela água, concentra-se nos sedimentos onde, em condições anaeróbias e pH ácido, é transformado em metilmercúrio pelas bactérias. Esta forma de mercúrio é rapidamente absorvida pelos organismos vivos, acumula-se e amplifica-se ao longo da cadeia alimentar: fitoplacton, zooplancton, peixes herbívoros, peixes carnívoros cada vez de maiores dimensões até chegar aos piscívoros como a águia, gaivotas e ao homem. Os peixes podem conter quantidades de mercúrio 400.000 vezes superiores às encontradas na água onde vivem. Quase 100% deste mercúrio está na forma de metilmercúrio, no tecido muscular do peixe, pelo que o seu consumo é a principal via de entrada do mercúrio no nosso organismo. A cadeia trófica terrestre, em circunstâncias normais, não é uma forma preocupante de exposição ao mercúrio, em comparação com a cadeia aquática. Os valores de mercúrio nos vegetais são geralmente baixos.
Consequências para a saúde Em 1953 registou-se na baía de Minamata, no Japão, uma doença nos consumidores de peixe contaminado por mercúrio, proveniente de uma fábrica de acetaldeido. O primeiro caso reconhecido da chamada doença de Minamata foi feito em 1957 pela Universidade de Kumamoto que estabeleceu de forma inequívoca a relação entre essa doença e os níveis de mercúrio encontrados no cérebro dos indivíduos mortos devido ao consumo de peixe da baia. Mais tarde, em 1959 em Niigata, também no Japão, surgiu novo acidente, embora com consequências menos graves. Os sintomas que as pessoas apresentavam eram essencialmente neurotóxicos: lesões permanentes no cérebro (sobretudo no cerebelo), irritabilidade, tremores, dificuldades de memória, perturbações visuais e auditivas para além de problemas renais (insuficiência renal). Nas grávidas, o mercúrio atravessa a placenta podendo provocar no feto lesões cerebrais graves, produzir desorganização do posicionamento dos neurónios do cortex, o que leva a paralisia cerebral, tónus muscular alterado e atraso no desenvolvimento. São estes os efeitos mais gravosos que nos levam a concluir que o mercúrio é teratogénico. As aberrações cromossómicas observadas nas células sanguíneas das populações expostas a um consumo frequente de peixe contaminado demonstram também a genotoxicidade do mercúrio. |
Os níveis de mercúrio têm aumentado no ar, na água e no solo devido ao seu grande uso na indústria e à sua utilização há muito tempo na agricultura. O metilmercúrio, por exemplo, foi usado como um ingrediente ativo de fungicidas em tratamentos de sementes de cereais e produziu muitos incidentes de intoxicação humana no Iraque, Ghana, Guatemala e Paquistão. A doença de Minamata ocorreu devido ao consumo de metilmercúrio presente em peixes contaminados, como decorrência da liberação de mercúrio metálico na água por uma indústria.
Segundo dados da World Health Organization (1991)
o mercúrio é utilizado em:
Indústrias de produção de cloro-soda:
Segundo Hartman (1988), apenas nos Estados Unidos, mais de 11 milhões de libras
de mercúrio são utilizados por indústrias elétricas, de tinta, farmacêuticas
e outras. Korringa e Hagel, citados na publicação da World Health Organizations
(1991), sintetizaram o consumo médio setorial dos países industrializados: indústrias
de cloro-soda - 25%; de equipamento elétrico - 20%; pinturas - 15%; instrumentos
de medição e controle (termômetros e esfigmógrafos, entre outros) - 10%; agricultura
- 5%; odontologia - 3%; laboratórios - 2%, outros usos - 20%. Devido à sua
volatilidade, que aumenta com a elevação da temperatura ambiental, altas concentrações
de mercúrio podem ser encontradas em ambientes de trabalho onde existe o referido
metal. O Instituto Nacional de Segurança e Saúde Ocupacional - NIOSH, uma
agência do Departamento de Saúde, Educação e Bem-Estar americano, estima que
nos Estados Unidos da América cerca de 150.000 pessoas possam estar expostas
ao mercúrio no trabalho, distribuídas em cinqüenta e seis ocupações. Em
indústrias de cloro-soda existe tecnologia alternativa ao uso de mercúrio.
Porém ainda existem empresas que utilizam o mercúrio nas células. Uma delas,
para mostrar a sua preocupação com o meio ambiente, apareceu na televisão mostrando
um lago com patos e peixes na frente da empresa. No entanto, dificilmente vemos
uma empresa mostrar na televisão seu ambiente interno de trabalho. Dentro das
paredes de uma empresa de cloro-soda certamente não encontraremos flores, lagos,
patos e peixes.”
Assim Exª, constata-se a seriedade e efeitos nefastos do uso do mercúrio na produção de soda e cloro.
A justificativa que resultou na Lei Federal nº 9.976/00 (fls. 810/814), que proíbe novas construções de células de mercúrio e a mantença das já existentes, da lavra do Deputado Federal Jair Meneguelli, é uma clara submissão ao looby das indústrias de cloro.
É de uma incoerência ímpar, ao afirmar que a troca da tecnologia seria inviável economicamente, mas que doravante as células de mercúrio não mais poderiam ser construídas.
Referida tecnologia está sendo banida em todo mundo. Onde existem estão sendo trocadas. Não se admite que se permita que uma empresa como a Carbocloro (sob os auspícios da economia do mercado), permaneça despejando (ou escondendo) quatro mil toneladas de resíduos de mercúrio, como fez no passado, nos próximos anos.
No Estado do Rio de Janeiro, fruto da Lei Estadual 2.436/95, e de uma ação civil pública do Ministério Público Estadual do RJ, Promotora Rosani da Cunha Gomes, a empresa Pan-Americana foi compelida a substituir sua produção de cloro por células de mercúrio para processos não agressivos ao meio-ambiente (art. 2º).
A CARBOCLORO é produtora de cloro e soda e utiliza em larga escala o mercúrio em sua produção, trazendo sérios riscos a saúde do trabalhador e do meio ambiente externo, poluindo o Rio Cubatão, contribuinte do estuário de Santos, além de estar localizada num bairro populoso de Cubatão.
A Lei 6.938/81, define poluidor como a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental (inciso IV do art. 3º). O mesmo Diploma Legal em seu art. 14 par. 1º consagra o princípio da responsabilidade objetiva do causador do dano ambiental, na medida em que dispõe: "sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente a terceiros afetados por sua atividade".
A Constituição Federal destinou capítulo próprio para o meio ambiente dispondo o seguinte:
"Art. 225:
“Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para presentes e futuras gerações.
§ 3º -
As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão
os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas,
independentemente da obrigação de reparar os danos causados”.
Por ser o Estuário, a Baia de Santos e as praias da região (onde deságua o Rio Cubatão), patrimônio nacional (Zona Costeira), nos termos do art. 225, § 4º, da Constituição Federal, e ainda por ser o mar territorial patrimônio da União (art. 20 da Carta Magna) e a proteção e preservação do meio ambiente serem também de competência da União Federal, nos termos do art. 23, incisos VI e VII, da Carta Magna, o Ministério Público Federal, aliás como prevê expressamente o art. 14, § 1º, da Lei 6.938/81, está legitimado a propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA, segundo ainda o estatuído no artigo 1º, inciso I, da Lei n.º 7.347/85, nos termos do art. 129, inciso III, da Constituição Federal, eis que se trata de proteção do meio ambiente.
É competente para apreciar e julgar o presente feito, uma das Varas Federais da Seção Judiciária em Santos, consoante o art. 109, inciso I, da Constituição Federal, c/c art. 2º, da Lei n.º 7.347/85, uma vez que é o foro do local onde ocorreu o dano, bem como, a União tem legítimo interesse jurídico no feito, devido ter sido lesado o meio ambiente.
Ademais, a União Federal também é ré nesta ação, devendo ser compelida em um prazo de doze meses a exigir que todas as fábricas produtoras de cloro e soda no país, substituam a obsoleta e nefasta tecnologia com células de mercúrio por outra tecnologia que não agrida o meio-ambiente (arts. 170, V, e 225 da CF/88).
Os réus são partes passivas legítimas para responderem pelo dano apontado e para cumprirem com as suas obrigações de fazer, nos termos dos arts. 3º da Lei nº 9.605/98 e 225, § 3º, da Constituição Federal.
É inafastável a responsabilidade em matéria de reparação de dano ambiental, de tal sorte que a imposição das sanções aos responsáveis pelos danos, dar-se-á da forma mais completa possível, a repor o “status quo ante” (no caso, em relação a co-ré CARBOCLORO).
Emérito e ínclito magistrado, considerando que durante anos a empresa CARBOCLORO, vem poluindo o meio-ambiente, com os resíduos tóxicos do mercúrio metálico, sendo que até o final da década de 70, jogava o mercúrio praticamente “in natura” no Rio Cubatão, e após, passou a “tratar” o resíduo, sendo que o resíduo sólido veio a enterrar nos silos (onde se constatou contaminação do lençol freático), e o resíduo líquido, após um período de “tratamento” é jogado no Rio Cubatão intermitentemente (portanto a contaminação é perene), tendo sido inclusive detectado por estudo do Médico Eládio do Santos, a contaminação por mercúrio em crianças que se alimentam de peixes do Rio Cubatão (o que pode levar a morte), e que a empresa possui uma outra unidade produtora de cloro, com tecnologia sem o uso de mercúrio (com o que a fábrica enquanto não se adequar apenas diminuirá sua produção); e considerando tudo mais que consta dos autos, estando presentes o fomus boni iuris e o periculum in mora, o primeiro representado pela legislação citada e o segundo pela contaminação por mercúrio do Rio Cubatão, Estuário de Santos e praias da região (note-se que grande parte dos peixes consumidos na região estão contaminados por mercúrio), o Ministério Público Federal requer a V. Exª, a concessão de MEDIDA LIMINAR, determinando a Ré, empresa CARBOCLORO, que no prazo de 06 meses, desative sua unidade de produção com células de mercúrio, passando-a para uma nova tecnologia que não agrida o meio ambiente (células de membrana ou outra); e determinando que a ré UNIÃO FEDERAL em um prazo de doze meses determine a todas as empresas produtoras de cloro e soda no país que desativem suas unidades de produção com células de mercúrio, passando-a para uma nova tecnologia que não agrida o meio ambiente.
Ante o exposto Exª, requer-se a condenação dos réus na obrigação de fazer para evitar a continuidade de dano ambiental, e assim, respectivamente, modifique sua unidade e determine a todas as fábricas do país, a forma de produção de soda e cloro, das atuais células de mercúrio para outra tecnologia que não agrida o meio ambiente e ainda a condenação do primeiro réu (a CARBOCLORO) a reparar o dano ambiental provocado ao longo de décadas, com o pagamento de indenização e ainda com a recuperação às suas expensas, da área do ponto de vista ambiental anterior, acrescida das custas, honorários e demais despesas processuais de sucumbência, com apresentação prévia ao MPF e ao Juízo de projeto de recuperação ambiental do Rio Cubatão (e suas margens) e Estuário de Santos.
Requer-se ainda a condenação da ré CARBOCLORO, ao pagamento da indenização pelos danos causados aos interesses difusos ao longo destas décadas (desde 1964), a serem liquidados na forma da lei, com a indenização a ser recolhida na forma do art. 13 da Lei 7.347/85.
Requer ainda que a CARBOCLORO seja condenada a reflorestar a margem do Rio Cubatão, com árvores típicas da Mata Atlântica ou típicas de Matas Ciliares, e a retirar seu depósito de sal para uma distância mínima de 100 metros do rio, conforme recomendação do IBAMA (fls. 835/836), mediante projeto por técnico habilitado.
Requer que a CARBOCLORO seja intimada a notificar com bastante antecedência a intenção de movimentar resíduos mercuriais a Promotoria Federal e Estadual, dentro de sua unidade ou fora dela.
Requer a publicação de edital em consonância com o art. 94 da Lei 8.078/90, c/c o art. 21 da Lei 7.347/85, a fim de que os interessados possam intervir no processo como litisconsortes, com a divulgação da propositura da ação nos meios de comunicação social.
Neste escopo, o autor requer a citação dos réus, nos endereços já citados, para querendo, virem contestar a demanda, sob pena de revelia, a qual, ao final, deverá ser julgada procedente, nos termos do pedido.
Requer, outrossim, provar o alegado através de provas testemunhal, documental e pericial.
E desde já requer a intimação da CETESB para que proceda a sondagens na empresa CARBOCLORO, para verificar se a contaminação do lençol freático se estendeu para a empresa Rhodia; que elabore uma planta da área da Carbocloro com o posicionamento dos poços, profundidade, com a respectiva indicação em relação ao lençol freático, direção, espessura e velocidade do fluxo do lençol freático e possíveis inteconexões com outras unidades aqüíferas, e ainda a indicação das plumas de contaminação.
Que sejam oficiados para a CETESB e a ré CARBOCLORO, para que expliquem e comprovem onde foi depositado as 4.000 toneladas de resíduos tóxicos de mercúrio, que estavam enterradas no pátio da empresa, em silos, e que teriam sido levadas para São José dos Campos, que é local que não admite mais receber lixo tóxico. Afinal, onde estará depositado este mercúrio? Estará ainda dentro dos caminhões? Foi depositado contra a lei na cidade de São José dos Campos? Voltou ao pátio da Carbocloro?
Que seja oficiado ao DAEE, para que este informe se a CARBOCLORO possui outorga de uso de água do Rio Cubatão, e em qual volume, e ainda para que proceda uma vistoria na CARBOCLORO e verifique o efetivo volume mensal de utilização da água do Rio Cubatão (o DAEE não respondeu ao ofício do MPF de fl. 777 nesta senda), bem como já informe que ante o uso de sal anualmente apontado a fl. 784, implica em qual uso da água do rio.
Requer a intimação da ONG ACPO (Associação de Consciência à Prevenção Ocupacional), para que ingresse na lide como litisconsorte do Ministério Público Federal, conforme interesse demonstrado nos documentos de fls. 805 e 806 (endereços da mesma nas referidas peças) deste procedimento.
Requer ainda a realização de sensoriamento remoto por satélite, para verificar a incidência da contaminação por mercúrio na área da Baixada Santista, e a sua origem (Carbocloro), indicando para tanto o Engenheiro Ulf Walter Palm, ex-INPE, de São José dos Campos.
Requer a oitiva em audiência do médico Eládio Santos Filho, que realizou estudo em 200 crianças de Cubatão, contaminadas por mercúrio; Cecília Zavariz (doutorado na USP em contaminação por mercúrio) e Sílvia Satori (oceanógrafa em Santos, professora da UNIMONT).
Dá-se à presente causa o valor provisório de R$ 500.000,00.
Santos, 18 de outubro de 2001.
Pedro A. Roso
Procurador da República